“Eu nunca tinha tido uma demonstração de carinho e amor de uma forma tão desapegada e desinteressada como na Julita:
Estava na presidência da Julita e tive que fazer uma operação. Estava muito impactado com isso e também com questões de saúde do meu pai. Daí quando chego na Julita, a faxineira, Dona Hilda, me diz: ‘o senhor está melhor? Fizemos um grupo de oração para que tivesse sucesso na cirurgia’. Ela não precisava ter feito isso, mas fez porque queria meu bem. Tenho eterna gratidão por aquele momento”.
Essa é uma das histórias que Lucien Bernard Belmont lembra de maneira muito especial quando cita a Fundação Julita. Ele foi presidente da organização de 2003 a 2010. Conheceu a Fundação de um jeito legítimo, pelo relato de uma das beneficiárias da ONG.
A faxineira do escritório da mãe de Lucien falou muito bem da organização em que o filho dela estava sendo atendido. Foi o que motivou Lucien de ir até lá para conhecer a Fundação, com a então namorada que acabou fazendo o primeiro trabalho de Comunicação da história da ONG.
Lucien já trilhou outro caminho. Na terceira vez que foi à organização, perguntou para a então presidente da Julita, Dona Solange, como ele poderia ajudar a organização. E ela foi surpreendente já vislumbrando seu potencial: “vou viajar, ficar um tempo fora, e passar a presidência para você”. Jovem e empresário, Lucien topou o desafio!
A partir dali, foi assumindo a gestão dia a dia. Começando com ações para a mudança da cultura institucional aliada com um processo de ir entendendo o social. Afinal, sua experiência vinha do setor corporativo.
“Achava que ia ajudar a Julita, mas tive um dos aprendizados mais bonitos da minha vida nos anos que passei lá. Comigo entrou um grupo novo, que foi mudando a dinâmica de trabalho, modernizando. E participar do cotidiano da Julita, com uma equipe engajada, motivada, transformadora, encontrando espaços para construir sonhos e realizar coisas, foi muito legal”.
Além da mudança de mentalidade de gestão, de gerir pessoas, empoderando-as para fazerem a diferença, ele conta que o que mais fez foram obras na Julita. Ampliação da creche (que passou a oferecer 160 vagas a mais, do total de 320), construção das quadras, da biblioteca e do prédio dos programas da Criança e do Adolescente e da Juventude e reformas da cozinha foram algumas delas.
Na gestão de Lucien, a organização também passou a oferecer novas atividades, como Lian Gong, ações esportivas, de psicopedagogia, dentista. Mas foi no trato com as pessoas que ele lembra dos resultados mais significativos:
“Uma vez, a nova coordenadora pedagógica me chamou e disse não entender muito sua função porque o porteiro veio falar do problema de um pai. Expliquei que era isso mesmo, que tem que falar mesmo sobre isso, essa é a forma de tratar o ser humano na Julita. No nosso compromisso com educação e desenvolvimento de pessoas, a visão pedagógica precisa ser integral, do momento que atender o telefone ou quando a pessoa pisar aqui até a hora de ir embora. Isso foi um aprendizado também para mim”.
Em outra história, contada por Lucien, o caseiro que morava na Julita disse pra ele, após um caso de roubo de dois computadores no espaço: ‘Lucien, precisa colocar arame farpado, caco de vidro na organização. Minha casa fica no meio do nada (na região de cima da Julita)’. Ao que o então presidente replicou: “Só vamos cumprir nossa missão o dia que não tiver muro, a organização é um benefício para todos e não só para algumas pessoas”. Lucien contextualiza que aquela era uma mudança na forma de entender o espaço. “Por isso, fizemos a fazendinha, para ocupar as áreas que não tinham muita gente circulando”.
Na época, Lucien cita que tudo que aparecia na Julita virava uma oportunidade para mostrar e explicar a forma de um mundo melhor para as crianças. E todo esse benefício retornava. “A Julita conta com a providência divina muitas vezes, porque fazemos muita doação, a gente se doava muito sem esperar retorno por isso, o que cria uma vibração muito legal de doação e entrega”. Então, ele conta que o Universo se encarregava de trazer ajuda nos momentos complicados.
A dimensão do trabalho na Julita tem um viés tão grande e significativo que Lucien demorou para se dar conta. Em um trabalho com jovens para reformular o logotipo da organização, um deles entregou o seguinte desenho: duas mãos no formato de coração segurando o escrito: ‘Fundação Julita porque minha vida está em suas mãos’.
“Eu não tinha noção daquilo até então. Eu me senti tão responsabilizado, comprometido; entendi o tamanho do que estava fazendo”.
Viver em organização social é lidar com ganhos e perdas. “Fui assaltado outro dia e, quando pegaram a pessoa que me roubou descobrimos que era morador do Jardim São Luís, pensei: erramos em alguma coisa, a gente deveria ter ganhado esse jovem. Mas, no fundo, a gente sempre soube que iria perder também. Lembro da frase: ‘na eterna luta do rochedo contra o mar serei o mais valente’. E daí, no fim das contas, quando a gente voltava no outro dia pra Julita chegávamos com entusiasmo renovado para recomeçar”.
A motivação sempre vem de relatos de transformação, como a da sobrinha da Dona Hilda (citada no começo deste depoimento), que Lucien lembra com emoção. Ela foi atendida em um projeto com a Jr. Achievement de empregabilidade na Julita e trabalhou por anos na parte administrativa da creche e outras áreas. E, recentemente, ele a encontrou na Casa Cor procurando ideias de decoração para o apartamento dela. “Essa menina está tendo uma qualidade de vida muito melhor, uma evolução fantástica, assim como várias pessoas que a Julita ajudou, e isso não tem preço”.